Frei Bento Domingues, comentando a situação do país e o papel da igreja perante a austeridade, declara: perante tanta injustiça, a insurreição acontecerá.
Na sua crónica de Domingo, Frei Bento Domingues diz-nos que há escritores que procuram no silêncio a profundidade da existência. Destaca Etty Hillesum, uma judia holandesa, morta em Auschewitz aos vinte e oito anos. Frei Bento Domingues transcreve, no Público, fragmentos do seu Diário (1941-1943); fragmentos que dão conta da resistência à humilhação que os nazis procuravam impor aos judeus.
(...) Podem tornar-nos as coisas algo complicadas, podem roubar-nos alguns bens materiais, alguma aparente liberdade de movimento, mas somos nós que cometemos o maior roubo a nós próprios.(...) Bem podemos, às vezes, sentirmo-nos tristes e abatidos por causa daquilo que nos fazem, isso é humano e compreensível. Porém, o maior roubo que nos é feito somos nós mesmos que o fazemos. Eu acho a vida bela e sinto-me livre.
Belo texto de Frei Bento Domingues, hoje, no Público.
(...)
Se a poesia é a única prova concreta da existência do ser humano como humano, a música é a alma de toda a poesia, presente, aliás, no ritmo de todas as artes que verdadeiramente o sejam. Como linguagem suprema da transcedência humana, rasga o tecto do mundo, expõe-se ao sopro divino, religação do céu e da terra.
M. S. Lourenço sustenta, nos Degraus do Parnaso, que a literatura, entendida como incluindo a poesia e a prosa, tem a tarefa de nos levar até à fronteira do inexprimivel. Para ele, o problema subjacente consiste em que a linguagem, de que a literatura é a arte (no sentido em que a música é a arte do som), funciona dentro de limites que não podem ser ultrapassados. Isto leva a que a linguagem não seja capaz de representar completamente todo o âmbito da experiência. Existe, assim, uma parte da experiência que não é representável linguisticamente, logo literalmente.
Este poeta chama inexprimivel a este domínio da experiência linguisticamente inacessível. A grandeza relativa da arte da linguagem pode, justamente, medir-se pela sua capacidade de levar o leitor à intuição desse domínio, embora dele não possa ser feita qualquer descrição. O verdadeiro artista é aquele que encontrou expressão simbólica da experiência transcendente.
Por este caminho, M. S. Lourenço colocou a questão das fronteiras entre a literatura e a religião. Tem defendido a ideia de que o oculto religioso não existe incondicionalmente e que a expressão da experiência religiosa é condicionada pela formulação literária que a descreve, uma vez que esta é o veículo da asserção religiosa. Neste sentido, uma doutrina religiosa é apenas tão verdadeira quanto o for a formula literária que a transmite.
(...)
Não existe sagrado fora do homem.
Frei Bento
A má-língua nada tem a ver com o espírito crítico, que se caracteriza pela capacidade de ver, analisar e avaliar, isto é, saber destrinçar para decidir segundo todos os dados recolhidos. A má-língua é derrotista e paralisante. O espírito crítico, pelo contrário, (...) levanta questões que, pondo em causa falsas evidências, abrem caminho à investigação do desconhecido.
Frei Bento Domingues, Público
Embora ateia, leio com gosto Frei Bento Domingues.
Retive a frase que citou hoje, no Público, arrancada aos ensinamentos da parábola de S. Lucas:
Quem é fiel nas coisas pequenas também é nas grandes; e quem é injusto nas coisas pequenas também é injusto nas grandes.
sophia de mello breyner andresen