Era uma vez ..."um Rei" - dirão logo os meus gentis ouvintes. Exactamente, desta vez adivinharam. Era uma vez o último rei de Itália, Vítor Manuel III, que partiu para o exílio quando a Segunda Guerra Mundial acabou. Tinha fama de possuir escassa cultura humanística e interessava-se principalmente pelos problemas económicos e militares, embora fosse coleccionador apaixonado de moedas antigas. Conta-se que um dia teve de inaugurar uma exposição de pintura. Ao chegar diante de um quadro com uma belíssima paisagem, que representava um vale com uma aldeia alcandorada na encosta de uma colina, contemplou-o demoradamente e depois, voltando-se para o director da exposição, perguntou: " Quantos habitantes tem a aldeia?"
Umberto Eco, Seis Passeios nos Bosques da Ficção, Difel, pp 81
Há pedaços de leituras que suspendem e esbatem fronteiras entre a ficção e a realidade.
Consequências do contrato - ficcional - que o leitor estabelece com o autor.
Aceitar a presença de personagens ficcionais e seguir o seu rasto, de texto para texto, liberta-as da história que as criou. E permite que o leitor as re-invente aumentando-lhes realidade.
E servem de terapia contra o sono da razão.
Se é um poema fraterno que pedis,
Arrancai-o de mim, escavando-lhe a raiz,
E plantai-o no vosso coração.
Miguel Torga
Desde Platão que a ideia de uma sociedade ideal, pela eliminação de seres considerados inferiores, vem fazendo caminho.
Em O Futuro da Natureza Humana, Habermas apresenta páginas de reflexão sobre o tema e alarga a discussão para terrenos menos comuns ao primeiro olhar.
Salienta que neste último século, o chamado eugenismo científico, com implicações políticas, foi ganhando terreno.
Em Portugal, a matriz católica disfarçou aquilo que se chamou eugenismo de estado.
A revolução genética interfere, definitivamente, na natureza humana.
E, hoje, a tendência é para um eugenismo liberal, individual.
O pêndulo da temporalidade dará sentido a esta notícia em termos institucionais e jurídicos; e éticos.
É urgente a discussão sobre "prevenção e eugenia".
(...) Os defensores da eugenia liberal estabelecem um paralelo entre a modificação genética de factores hereditários e a modificação de atitudes e expectativas operadas pelo processo de socialização. Pretendem deste modo demostrar que, do ponto de vista moral, não existe nenhuma diferença apreciável entre eugenia e educação.
J. Habermas, O Futuro da Natureza Humana, A Caminho de uma Eugenia Liberal?, Almedina, 2006, pp 92
Tempo virá em que a investigação diligente, cobrindo longos períodos, esclarecerá coisas que hoje estão escondidas.
O tempo de uma vida, mesmo que totalmente dedicado ao estudo do céu, não seria suficiente para a investigação de tão vasto tema.(...)
O nosso universo seria uma coisa insignificante se não houvesse sempre nele algo a ser investigado por gerações que vão surgindo(...)
A natureza não revela os seus mistérios de uma só vez.
Séneca, Questões Naturais, livro 7, séculoI in Cosmos, Carl sagan
Na Antiguidade, os acontecimentos quotidianos eram relacionados com os fenómenos do Cosmos para adquirirem realidade.
A história humana pode ser analisada através da tomada de consciência do lugar do homem no universo infinito. E da sua pequenez.
Hoje o método simplifica o trabalho. Mas o mistério e o fascínio mantêm-se.
A linguagem científica interpreta, traduz e aproxima o homem do universo; de si mesmo. E exige uma atitude de humildade.
Sigamos o destino do Homem. Aqui
Conceptualmente, podemos chamar verdade àquilo que não podemos mudar; metaforicamente, ela é o solo sobre o qual nos mantemos e o céu que se estende por cima de nós.
Hannah Arendt, Verdade e Política, Relógio D`Água, p. 59.
(...) Quero dormir um instante,
um instante, um minuto, um século;
porém que todos saibam que não morri;
que há um estábulo de ouro em meus lábios,
que sou o pequeno amigo do vento Oeste;
que sou a sombra imensa das minhas lágrimas. (...)
Federico García Lorca, Obras completas, Madrid, 1960, pp 492
O mundo é xenófobo. O Homem também.
A indiferença instala-se. Aqui
Primeiro levaram os comunistas,
mas eu não me importei
porque não era nada comigo.
Em seguida levaram alguns operários,
mas a mim não me afectou
porque não sou operário.
Depois prenderam os sindicalistas,
mas eu não me incomodei
porque nunca fui sindicalista.
Logo a seguir chegou a vez
de alguns padres, mas como
não sou religioso, também não liguei.
Agora levaram-me a mim
e quando percebi,
já era tarde.
Bertolt Brecht
Roubado de EcologicalMind
Da antropologia à ontologia resvalamos para arquitecturas que definem e delimitam o emaranhado de questões que o Homem coloca sobre si mesmo.
Há espaços, que percorremos, com trilhos para ilhas desconhecidas.
Desconcertantes. Mas abrem possibilidades.
Percorra-as. aqui.
As diferenças (entre culturas) não implicam necessariamente conflito e o conflito não implica necessariamente violência.
Samuel Huntington
Há sempre estranheza quando os indivíduos pertencentes a uma cultura contactam com outra diferente da sua.
Nos nossos dias continuam visíveis atitudes etnocêntricas, embora se reconheçam ilhas de interculturalidade.
Ultrapassemos regionalismos. Dialoguemos como cidadãos do mundo.
É urgente a prática diária da tolerância.
Este não é o caminho.
Quando ninguém me coloca a questão, eu sei; mas quando alguém ma coloca e eu quero responder, já não sei.
Santo Agostinho, Confissões, XI,XIV
Há situações assim. Não procuramos a resposta e ela surge por si; queremos saber mais e, inesperadamente, a razão desorienta-se.
As palavras são boas. As palavras são más.
As palavras ofendem. As palavras pedem desculpa. As palavras queimam.
As palavras acariciam. As palavras são dadas, trocadas, oferecidas, vendidas e inventadas.
As palavras estão ausentes. Algumas palavras sugam-nos, não nos largam: são como carraças: vêm nos livros, nos jornais, nos slogans publicitários, nas legendas dos filmes, nas cartas e nos cartazes. As palavras aconselham, sugerem, insinuam, ordenam, impõem, segregam, eliminam.
São melífluas ou azedas.
O mundo gira sobre palavras lubrificadas com óleo de paciência.
Os cérebros estão cheios de palavras que vivem em boa paz com as suas contrárias e inimigas.
Por isso as pessoas fazem o contrário do que pensam, julgando pensar o que fazem.
(...)
Há também o silêncio.
(...)
Saramago, Deste Mundo e do Outro
sophia de mello breyner andresen