Tudo está
no som. Uma canção.
Raramente uma canção. Deveria
ser uma canção - com
pormenores, vespas,
uma genciana - algo
imediato, tesouras
abertas, olhos
de mulher - centrífuga
ao despertar, centrípeta
William Carlos Williams, Antologia Breve, Assírio & Alvim, pág. 73
( selecção e tradução - José Agostinho Baptista)
Ainda esta semana, na secretaria da escola, fui prontamente corrigida ao designar o grupo disciplinar em que lecciono: - Não professora, 410.
Um texto, oportuno, onde, através de um jogo de linguagem, se pensa a Escola e os seus desafios actuais.
Em O Amigo, Agamben apresenta-nos o heteros autos como alteridade imanente na mesmidade e define a amizade nos limites da con-partilha. Não há na amizade nenhuma relação entre sujeitos: é o próprio ser que é dividido, que não é idêntico a si, e o eu e o amigo são as duas faces - ou antes os dois pólos - desta con-partilha. Tendo como pré-texto um trecho da Ética Nicomaqueia de Aristóteles e depois de termos sido convidados a fazer a leitura em conjunto, Agamben discursa sobre a relação humana da amizade e sobre as bases ontológicas e políticas em que se auto-sustenta.
A amizade é a instância desse con-sentimento da existência do amigo no sentimento da sua própria existência.
Esta é a madrugada que eu esperava
0 dia inicial inteiro e limpo
Onde emergimos da noite e do silêncio
E livres habitamos a substância do tempo.
Sophia de Mello Breyner Andresen
Ontem, no Público
O sistema funciona como uma série de cavernas rochosas, em que já não sabemos se estamos a ouvir o grito ou o eco. A notícia é já somente a reverberação daquilo que disse fulano sobre o que comentou sicrano acerca do desafio lançado por beltrano.
(...)
A verdadeira tragédia anda soterrada debaixo de tanto falatório. Está nas pessoas desempregadas, na dificuldade em pagar as contas, nas dívidas que se acumulam, nos negócios que vêem aproximar-se a guilhotina das falências. Pior, a verdadeira tragédia vive exacerbada por este ambiente político e mediático: esperando por um ponto de viragem, mas só encontrando no discurso público inconsequências e mais-do-mesmo, as pessoas acabam por descrer.
Rui Tavares
Pouco me importa.
Pouco me importa o quê? Não sei: pouco me importa.
Alberto Caeiro, Poemas Inconjuntos
A arte é uma constante pergunta. É a busca do sentido.
Manuel Alegre, ontem, na TVI 24.
Neste espaço a si próprio condenado
Dum movimento para o outro pode entrar
Um pássaro que levante o céu
E sustente o olhar
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Com a tristeza acender a alegria
Com a miséria atear a felicidade
E no céu inocente da visão
Fazer pulsar um pássaro por vir
Fazer voar um novo coração
Alexandre O'Neill, epígrafe ao livro "No Reino da Dinamarca", 1958
O contrário da matéria
não é o espírito.
O contrário da matéria
não é a anti-matéria.
O contrário da matéria
é o olhar.
Pedro Mexia, Duplo Império
Exposição histórico-retrospectiva "Da Alemanha, 1800-1939: De Friedrich a Beckmann",
Ao todo, são duas centenas de obras distribuídas por três núcleos temáticos: Apolíneo e Dionisíaco; A Paisagem como História, de Caspar David Friedrich a George Grosz; Ecce-Homo, Humano-Desumano. Começa sob os auspícios de Goethe e Nietzsche, e de um lugar simultaneamente temporal e geográfico que tanto vai beber à estética Grécia clássica como ao desejo de um presente germânico-alemão. Gottlieb Schick, Moritz von Schwind, Friedrich Schinkel, Arnold Böcklin, Hans von Marées, Franz von Stuck e os já referidos Caspar David Friedrich e Max Beckmann são os artistas em cena.
O desejo de erigir a pintura da Paisagem em pintura da História, fazendo da natureza a protagonista maior desta arte, é o denominador comum do segundo núcleo, com obras de Jacob Philip Hackert, Joseph Anton Koch, Carl Gustav Carus, Philip Otto Runge, Paul Klee, Otto Dix, Franz Radziwill e George Grosz, além de uma grande sala dedicada a Friedrich.
Finalmente, Ecce Homo, na sua dupla dimensão humano-desumano, abre com a famosa tela de Adolf Friedrich Erdman von Menzel, A Forja (1872-75), elogio dos novos ciclopes, os heróis do trabalho, sobre cujo imaginário se erigiu a Prússia, e atravessa o traumatismo da Primeira Guerra Mundial até ao advento do nazismo e da barbárie. Lovis Corinth, Otto Dix, George Grosz, Christian Schad e Max Beckmann ajudam também a traçar este percurso, que, na história da pintura, desemboca na famosa exposição Arte degenerada, organizada pelos nazis em Munique, em 1937. Bastariam mais dois anos para que nem a Arte nem a História voltassem a ser as mesmas...
sophia de mello breyner andresen