Em vez de avançar para a autotransparência, a sociedade das ciências humanas e da comunicação generalizada avançou para aquela que, pelo menos em geral, se pode chamar a "fabulação do mundo". As imagens do mundo que nos são fornecidas pelos media e pelas ciências humanas, embora em planos diferentes, constituem a própria objectividade do mundo, e não apenas interpretações diferentes de uma "realidade" de algum modo dada. " Não nos fizeram, apenas interpretaram", segundo o dito de Nietzsche, que escreveu também que " o mundo verdadeiro tornou-se uma fábula".
Não tem, decerto, sentido negar pura e simplesmente uma "realidade unitária" do mundo, numa espécie de recaída nas formas de idealismo empírico-ingénuas. Mas tem mais sentido reconhecer que aquilo que chamamos a "realidade do mundo" é alguma coisa que se constitui como "contexto" das múltiplas fabulações - e tematizar o mundo nestes termos é precisamente o dever e o significado das ciências humanas.
Gianni Vattimo, A Sociedade Transparente
(Em Diálogo, Manual 11º ano)
O efeito final de proteger os homens contra os efeitos da loucura é encher o mundo com os tolos.
Herbert Spencer
XXXIII
Devemos andar sempre bêbedos. Tudo se resume nisto: é a única solução. Para não sentires o tremendo fardo do Tempo que te despedaça os ombros e te verga para a terra, deves embriagar-te sem cessar.
Mas com quê? Com vinho, com poesia ou com a virtude, a teu gosto. Mas embriaga-te.
E se alguma vez, nos degraus de um palácio, sobre as verdes ervas duma vala, na solidão morna do teu quarto, tu acordares com a embriaguez já atenuada ou desaparecida, pergunta ao vento, à onda, à estrela, à ave, ao relógio, a tudo o que se passou, a tudo o que gemeu, a tudo o que gira, a tudo o que canta, a tudo o que fala, pergunta-lhes que horas são: " São horas de te embriagares! Para não seres como os escravos martirizados do Tempo, embriaga-te, embriaga-te sem cessar! Com vinho, com poesia, ou com a virtude, a teu gosto."
Charles Baudelaire, O Spleen de Paris ( Pequenos poemas em prosa), Relógio d`Água, p.105
Uma das frases mais famosas de todos os tempos foi pronunciada, há mais de 2000 anos, por Cícero ( 104-43 a.C.), orador e pensador político romano. Cícero discursa perante o Senado de Roma, visando destruir uma tentativa de golpe de estado contra a República. A conspiração contra o Senado era dirigida por Lúcio Sérgio Catilina, candidato vencido ao cargo de cônsul. Desde Cícero, o termo "catilinária" passou a designar uma acusação enérgica e eloquente.
Oh tempos, oh costumes!
Cícero, As Catilinárias (0 texto consta do Caderno de Actividades Percursos - Filosofia 11º Ano, Areal Editores)
I
- De quem gostas mais, diz lá, homem enigmático? de
teu pai, de tua mãe, de tua irmã, ou de teu irmão?
- Não tenho pai, nem mãe, nem irmão, nem irmã.
- Dos teus amigos?
- Eis uma expressão cujo sentido até hoje ignorei.
- Da tua pátria?
- Não sei a latitude em que está situada.
- Da beleza?
- Amá-la-ia de boa vontade, divina e imortal.
- Do oiro?
- Odeio-o tanto como vós a Deus.
- Então que amas tu, singular estrangeiro?
- Amo as nuvens...as nuvens que passam...lá longe...
as maravilhosas nuvens!
Charles Baudelaire, O Spleen de Paris (Pequenos poemas em prosa), Relógio d`Água, p.11
o dia cai
há infelizes que o fim de tarde não acalma
e nem os descontentes entram na dança.
um golpe de vista sobre a cidade
toda a miséria embuçada
e a criança sem paciência e alma.
antes da noite
há amores felizes no cheiro bizarro da rosa
e o mar é turíbulo desconhecido.
sophia de mello breyner andresen