algumas horas outras invadiram as sedas, os perfumes
ácidos da louça, não serão recordadas. ou quanto mais
as recordarmos, mais a ignorância deitará
os corpos no tapume de vidros, para que em torno
se conciliem as vontades singulares, as
particularidades de um impetuoso alarme.
ou seja: deixarão as esplanadas baças, os garfos
encolhidos, para que um amplo destino os atravesse.
considerem, por exemplo o paquete que ao meio-dia
digere as minuciosas palmeiras sobre a
alta insensatez dos aquedutos. ou ainda
a ilusão dos alicates ao lado da água, e o seu reflexo
do outro lado das vidraças: azul, não é?
assim estas algumas outras horas: como esquecê-las?
António Franco Alexandre, Poemas, Assírio & Alvim, p.94
A conversa com a filha, Mónica Baldaque, permite saber de uma mulher e de uma escritora. Que são uma, como se verá. Agustina está retirada desde 2006. Deixou de escrever. Como olharia para a maneira como olhamos para ela?
Rindo-se. Seguramente.
Como é que vamos apresentar Agustina? A genial?, a sem medo?, a perversa?, a barroca (assim lhe chamava Óscar Lopes)? Estes são alguns dos epítetos mais comuns.
Todos lhe servem. O que é para além disso talvez não tenha definição. Verdadeiramente, aquilo que ela é está no riso.
No riso?
É uma das características fundamentais da minha mãe, da vida dela e do estar dela com os outros. O riso não tem que ver com a troça. Tem que ver com um segredo, com o mistério, com o estar numa outra dimensão. Há um provérbio judaico que diz: “O homem pensa, Deus ri.” Acho que aí a minha mãe está perto de Deus. O riso dela é como se fosse o riso de Deus.
(...)
De onde vem este gosto pelos vestidos? Um dos aforismos mais famosos: “O sucesso não vale tanto quanto um vestido novo.”
Tem razão.
Não era uma boutade?, acreditava nisso?
Absolutamente sim! Há tempos foi lá a casa uma pessoa visitá-la. Muito ternurenta, com aquele ar “coitadinha da senhora dona Agustina”. A mãe ouviu tudo, impassível. A senhora foi-se embora. A mãe: “Estava tão mal vestida!” [gargalhada]
"eu disse que os professores mantêm-se; eu não disse manter-se-ão"!
"O ataque à escola pública, esse elevador social que Abril lançou, começou cedo. Em tempos de vender o que é de todos, de interesse estratégico, mesmo se dando lucro (caso dos CTT), a escola pública vai sendo esmagada a favor do colégio privado."
Ler mais: http://expresso.sapo.pt/crato-essa-revolucao-cultural=f893243#ixzz3FqHVtJcx
"A decência manda que ninguém obtenha um emprego devido a uma injustiça, ainda que não tenha culpa nenhuma. Ninguém deve ser beneficiário de um erro grosseiro:"
A função da filosofia, escreve E. Morin, é a de alimentar o debate que permite fazer escolhas e dar um sentido à acção. E lutar contra um pensamento único, tecnocrático, que se imporia como evidência. Ora, a função do debate é essencial na Cidade, pois sem a crítica a tecnificação torna-se uma ameaça real à liberdade.
"A especificidade das tecnologias de comunicação do século XX, com a transmissão de som e de imagem, reside na sua capacidade para chegar a todos os públicos, a todos os meios sociais e culturais. À partida, os meios de comunicação social do século XX são tributários da lógica do número. E se algo pode simbolizar a sociedade dos nossos dias, esse algo será o tríptico: sociedade de consumo, democracia de massas e meios de comunicação social de massas - três características que instalam no coração da sociedade contemporânea a questão, tão essencial, mas tão pouco estudada, do número e da massa."
Dominique Wolton, E Depois da Internet?
xiii
2
Recordar não tem conteúdo vivencial.
(...)
3
Seria possível pensar a seguinte situação:uma pessoa recorda-se, pela primeira vez na
sua vida, duma casa e diz "Agora já sei o que é recordar, o que é que recordar me faz".
- "Como é que ela sabe que este sentimento é"recordar"? Compara: "agora já sei o que é
ser-se picado (acabava de receber pela primeira vez um choque eléctrico).
- Sabe ela que esta sensação é recordar, por ter sido provocada pelo passado?
E como é que ela sabe o que é o passado? O homem aprende o conceito de passado ao recordar.
(...)
L. Wittgenstein, Investigações Filosóficas, F. C. Gulbenkian, p. 609
Antes o vôo da ave, que passa e não deixa rasto,
Que a passagem do animal, que fica lembrada no chão.
A ave passa e esquece, e assim deve ser.
O animal, onde já não está e por isso de nada serve,
Mostra que já esteve, o que não serve para nada.
A recordação é uma traição à Natureza,
Porque a Natureza de ontem não é Natureza.
O que foi não é nada, e lembrar é não ver.
Passa, ave, passa, e ensina-me a passar!
Poemas Completos de Alberto Caeiro, Companhia Aguilar Editora, 1965, p. 224
Biblioteca Luso-Brasileira - Série portuguesa
Dia Internacional do Idoso
Os dados são tudo menos animadores: segundo um estudo divulgado pela Pordata, a propósito do Dia Internacional do Idoso que se assinala esta quarta-feira, não só Portugal é o 4.º país da União Europeia com maior percentagem de idosos (18%), como 23,6% destes vivem sozinhos e abaixo do limiar de pobreza. Além disso, o montante da grande maioria (77,9%) das pensões de velhice da Segurança Social é inferior ao salário mínimo nacional. Recuando um pouco no padrão etário, é também relevante dizer que em 2013, só 47% dos indivíduos entre os 55 e os 64 anos estavam empregados. A soma destes elementos negativos coloca-nos desafios a prazo que teremos necessariamente de superar. Se é verdade que os idosos em Portugal vão passar dos actuais dois milhões para mais de três milhões em 2060, é também verdade que nessa altura serão mais qualificados e, talvez por isso, menos sós. Mas é ao presente, amargo, que teremos de dar resposta.
sophia de mello breyner andresen