Camões explora neste soneto, as recordações do dia da partida para a Índia que o separaram da sua amada.
As contraposições e as contradições do amor, próprias da poesia do século XVI, estão aqui presentes. Neste caso, surgem entre o mundo interior e o mundo exterior.
O sentido do último terceto pode ser interpretado como uma alusão ao mito de Orfeu que com o seu canto fez cessar o sofrimento das almas do Inferno.
Aquela triste e leda madrugada
Cheia toda de mágoa e de piedade,
Enquanto houver no mundo saudade
Quero que seja sempre celebrada.
Ela só, quando amena e marchetada
Saía, dando ao mundo claridade,
Viu apartar-se de uma outra vontade,
Que nunca poderá ver-se apartada.
Ela só viu as lágrimas em fio.
Que de uns e de outros olhos derivadas,
Se acrescentaram em grande e largo rio.
Ela ouviu as palavras magoadas
Que puderam tornar o fogo frio
E dar descanso às almas condenadas.
Camões, Sonetos
sophia de mello breyner andresen