É incontornável. A questão da temporalidade da leitura de um texto obriga a atenção a dirigir-se para a distinção barthesiana entre textos de prazer e textos de gozo. Os textos de prazer, os clássicos, abrem-se ao entendimento do leitor sem sobressaltos; os textos de gozo, modernos, forçam a captação da sua inteligibilidade sob pena de fazer cair o leitor numa lentidão irreversível.
O que é que confere, então, rapidez à leitura? O que é que sistematiza a legibilidade? Roland Barthes diz que não há critérios objectivos para definir as práticas textuais, uma vez que só o próprio texto baliza o gozo do tempo de mergulho e a sua fenda. E depois, há sempre os livros que oferecem resistência.
Ser legível é um modelo clássico vindo da escola: ser legível é ser lido na escola.
(...) E não há maneira de escapar à violência da tempestade, a essa tempestade metafísica, simbólica. Não te iludas: por mais metafísica e simbólica que seja, rasgar-te-á a carne como mil navalhas de barba. O sangue de muita gente correrá, e o teu juntamente com ele. Um sangue vermelho, quente. Ficarás com as mãos cheias de sangue, do teu sangue e do sangue dos outros.
E quando a tempestade tiver passado, mal te lembrarás de ter conseguido atravessá-la, de ter conseguido sobreviver. Nem sequer terás a certeza de a tormenta ter realmente chegado ao fim. Mas uma coisa é certa. Quando saíres da tempestade já não serás a mesma pessoa. Só assim as tempestades fazem sentido.O tumulto interior de Hamlet é o tumulto do cidadão comum hoje. Todo o Príncipe -cada um de nós- encerra em si mesmo a crueza e a grandeza da sua época, e o abismo do Reino da Dinamarca é o abismo da Velha Europa. Reinos inquietos, como o Tempo. Como a leitura.
Ípsilon, sexta-feira, 11 de Maio de 2012.
Não procures uma multidão sincera
porque tal não existe.
Quando numerosos, os homens, os animais,
as plantas, as pedras e até as máquinas
perdem a higiene do raciocínio individual;
e, se abrem a janela que dá para o jardim,
é para cuspir, nunca para te dizer adeus.
Gonçalo M. Tavares, Uma Viagem à Índia, Caminho, pp 84-85
O vocabulário do amor é restrito e repetitivo, porque a sua melhor expressão é o silêncio. Mas é deste silêncio que nasce todo o vocabulário do mundo.
Vergílio Ferreira
A vida?
Gotas de luar
Gotas caídas
De gerânios a abanar.
K. Dogen, líder espiritual budista japonês.
As coisas são como são. A vida, um fluxo permanente. Sem captação.
Daí, hoje, concordar com Philip Roth, não há ninguém menos passível de ser salvo do que um sujeito bem destroçado.
Não me prendo a nada que me defina. Sou companhia, mas posso ser solidão; tranquilidade e inconstância; pedra e coração. Sou abraços, sorrisos, ânimo, bom humor, sarcasmo, preguiça e sono. Música alta e silêncio. Serei o que você quiser, mas só quando eu quiser. Não me limito, não sou cruel comigo! Serei sempre apego pelo que vale a pena e desapego pelo que não quer valer...
Suponho que me entender não é uma questão de inteligência e sim de sentir, de entrar em contato. Ou toca, ou não toca.
Clarice Lispector
Sobre o paradoxo do elemento religioso no mundo contemporâneo:
(...) O homem a-religioso no estado puro é um fenómeno muito raro, mesmo na mais dessacralizada das sociedades modernas. A maioria dos "sem-religião" ainda se comporta religiosamente, se bem que não esteja consciente deste facto.
Mircea Eliade, O Sagrado e o Profano
A realidade é concebida ao mesmo tempo que o olhar.
Goethe
Nos nossos dias, arte
radical significa arte sombria,
negra como a cor fundamental
Theodor W. Adorno
A poesia como atitude de religação essencial.
Sim, a poesia pode salvar o homem.
Czeslaw Milosw, O livro dos Saberes, p. 283
o meu maior desejo
sempre foi
o de aumentar a noite
para a conseguir
encher de sonhos
Virgínia Woolf
O filósofo espanhol Ortega y Gasset (1883-1955) escreveu, sem fingimento, que o Homem é um equilíbrio instável.
Sou uma parte de tudo aquilo que encontrei.
Bernardo Soares, Livro do Desassossego:
Não vejo, sem pensar.
A sociedade humana necessita de paz, mas necessita igualmente de conflitos sérios e de ideais: de valores, de ideias pelos quais possamos lutar. Na sociedade ocidental aprendemos- e aprendemos com os gregos- que é possível fazê-lo não tanto com a espada, mas muito melhor e mais persistentemente com palavras. E, sobretudo, com argumentos razoáveis.
Uma sociedade perfeita é, por conseguinte, impossível. Existem, porém, ordens sociais melhores e piores. A nossa civilização ocidental decidiu-se a favor da democracia, como uma forma de sociedade que pode ser alterada pela palavra e, aqui e ali- se bem que raramente- por argumentos racionais, por uma crítica racional, isto é, realista- através de reflexões críticas não-pessoais, características também da ciência, designadamente da ciência da natureza, desde os gregos. Sou, pois, um defensor da civilização ocidental, da ciência e da democracia. Elas dão-nos a oportunidade de prevenir o infortúnio evitável e de experimentar, de apreciar criticamente e, se necessário, aperfeiçoar as reformas (...). E confesso-me igualmente partidário da ciência, hoje tantas vezes caluniada, que busca a verdade através da auto-crítica e que, a cada nova descoberta, descobre de novo quão pouco nós sabemos- quão infinitamente grande é a nossa ignorância e falibilidade. Foram intelectualmente humildes. (...).
Karl Popper, Em Busca de Um Mundo Melhor
aberta na tua mão.
Podia ter sido amor,
e foi apenas traição.
É tão negro o labirinto
que vai dar à tua rua. . .
Ai de mim, que nem pressinto
a cor dos ombros da Lua!
Talvez houvesse a passagem
de uma estrela no teu rosto.
Era quase uma viagem:
foi apenas um desgosto.
É tão negro o labirinto
que vai dar à tua rua...
Só o fantasma do instinto
na cinza do céu flutua.
Tens agora a mão fechada;
no rosto, nenhum fulgor.
Não foi nada, não foi nada:
podia ter sido amor.
David Mourão Ferreira, À Guitarra e à Viola
(1954-1960)
Todos os homens têm medo. Quem não tem medo não é normal; isso nada tem a ver com a coragem.
Sartre
...No fim tu hás- de ver que as coisas mais leves são as únicas que o vento não conseguiu levar: um estribilho antigo, um carinho no momento preciso, o folhear de um livro de poemas, o cheiro que tinha um dia o próprio vento...
Mário Quintana
A cultura é a soma de todas as formas de arte, amor e pensamento que, ao longo dos séculos, permitiram ao homem ser menos escravizado.
Malraux
sophia de mello breyner andresen