A Gradiva começa bem o ano
«Linguagem e Silêncio - ensaios sobre a literatura, a linguagem e o inumano», de George Steiner
«Como considerar o poder e a utilidade da linguagem sabendo-se como foi usada para transmitir as falsidades mais ignominiosas nos regimes totalitários, ou serviu a demagogia repelente nas nossas democracias de consumo de massas? Como irá a linguagem reagir à exigência, cada vez mais premente, de um discurso preciso como a matemática e a notação simbólica? Estaremos a sair de uma era histórica de primazia verbal – a sair do período clássico da expressão escrita – e a entrar numa fase de linguagem decadente, de formas «pós-linguísticas» e talvez mesmo de silêncio parcial? Estas são algumas das questões fulcrais, em cada dia mais gritantes, que Steiner aborda neste livro, na sua prosa elegante e com a sensibilidade, a inteligência, a argúcia, a singularidade que todos lhe reconhecem.
“Uma análise extraordinariamente inteligente, brilhante, um desafio à reflexão, sobre as condições estranhas que a escrita moderna criou a si própria [...]. Poucos, muito poucos, escritores actuais têm tanto que valha a pena dizer sobre a produção escrita actual como este autor”, Joseph G. Harrison
O que toda a vida tentei ensinar foi a ler um pouco. Ler com outros. Nas minhas aulas sentávamo-nos com um texto para ler e, no final, o objectivo era ter aprendido algumas linhas de cor. Já a música é-me absolutamente indispensável. Sem ela poria termo à vida de imediato.
George Steiner, entrevista, in Ler, n.º 100
Enquanto existirem cafetarias, a ‘ideia de Europa’ terá conteúdo.
A Europa é feita de cafetarias, de cafés. Estes vão da cafetaria preferida de Pessoa, em Lisboa, aos cafés de Odessa frequentados pelos gangsters de Isaac Babel. Vão dos cafés de Copenhaga, onde Kierkegaard passava nos seus passeios concentrados, aos balcões de Palermo.
[…] Desenhe-se o mapa das cafetarias e obter-se-á um dos marcadores essenciais da `ideia de Europa´.
George Steiner, Uma Ideia de Europa, Tradução de Maria de Fátima Aubyn, Gradiva, 2007, p 26
A profissão de professor, também este um termo algo opaco, suporta todas as nuances possíveis entre, num extremo, na forma de vida rotineira e desencantada e, no outro, um elevado sentido de vocação. Compreende numerosas tipologias que vão desde a do pedagogo destruidor de espíritos à do Mestre carismático. Imersos como estamos em formas de ensino quase inumeráveis - elementar, técnico, científico, humanista, moral e filosófico - raramente nos distanciamos o suficiente para reflectir sobre as maravilhas da transmissão de conhecimentos, os recursos da falsidade e aquilo a que chamaria, à falta de um termo mais preciso e concreto, o mistério da função.
George Steiner, As Lições do Mestre, Gradiva, 2005, pp11
A análise, das relações entre mestre e discípulo, converte-se numa Lição.
Explicação simplificada - diz Steiner - do cruzamento dos eixos do tempo sobre a problemática do ensino e da aprendizagem.
Acentua a marca de transmissão de conhecimentos.
Recorda a etimologia da palavra transmissão (tradendere). Relaciona-a com a de traditio (o que foi transmitido) e com as de traição e tradução.
Salienta, de forma magistral, que a forma mais honesta de autoridade didáctica se faz através do exemplo.
E que o ensinamento é acção e silencioso; e oralidade.
Aqui o Mestre fala.
Não há ofício mais privilegiado. É trans-missão.
Re-comecemos a Lição.
sophia de mello breyner andresen