No dia 10 de Junho de 1974, um grupo de quarenta e oito artistas plásticos pintou, em Lisboa, um mural que viria a desaparecer, num incêndio, em 1981. Entre os pintores, muitas caras conhecidas : Júlio Pomar, João Abel Manta, Nikias Skapinakis, Menez, Vespeira, Costa Pinheiro, etc., etc.
https://caminhosdamemoria.wordpress.com/2009/06/29/1974-uma-pintura-colectiva/
Palavras de Ciro, o Jovem, rei dos Persas, aos comandantes dos Dez Mil, seus aliados, e preservadas por Xenofonte, Anabasis, I. 7. 3-4 (séc. V a. C.)
"Ó Gregos, não é porque me faltem soldados bárbaros que vos chamo, mas porque vos considero melhores e mais fortes que muitos bárbaros: por esta razão vos acrescento às minhas forças. Assegurai-vos pois de que estareis à altura da liberdade que possuís e pela qual vos digo abençoados. E ficai a saber que prefiro a liberdade a tudo quanto possuo e até a muito mais. Deixai-me explicar-vos para que guerra vos encaminhais. A massa do inimigo é vasta e avança com grandes brados; queirais vós enfrentá-los, inamovíveis; quanto ao outros, até a mim me envergonha a espécie de homens em que se tornaram os habitantes desta terra."
Na Segunda Guerra Mundial, sob o falso manto do voluntariado, o Japão recrutou pilotos suicidas na elite universitária do país. Embora " os voluntários" tivessem sido adestrados para morrer, deixaram escritos- cartas a familiares- onde estão gravadas as perplexidades, as dúvidas e medos da sua condição de Kamikase.
Os soldados-estudantes- os tokkõtai-, foram constituídos em Outubro de 1944 pelo vice-almirante Onishishi Takijiro com o proprósito de eliminar os porta-aviões americanos. Eram soldados treinados não tanto para matar, mas para morrer pela pátria.
O livro da americana Emiko Ohnuki-Tierney, Kamikase Diaries: Reflections of Japanese Student Soldiers, corrige a História e desvela a face, não sorridente, do sentir dos homens concretos.
No Diário de Hayashi Tadao, pode ler-se:
1 de Janeiro de 1944- Talvez o que nos espera seja uma funda desilusão e, para a nossa sociedade, uma anarquia insidiosa. Sonho em alongar-me sobre as ondas do mar num dia ensolarado de primavera para me intoxicar com pensamentos soltos enquanto o meu corpo se solta à deriva na água... De repente, vem -me à mente uma cena de Casa dos Mortos- no entardecer de um dia de verão de céu esbranquiçado, os prisioneiros são empurrados para dentro das celas.
Vivo na solidão.
8 de Maio- O individualismo não é um mero "ismo", mas um princípio inato do ser humano. Realmente odeio os militares (...)
14 de Julho- Hoje encerro o meu diário, fruto da minha empobrecida vida espiritual. Eu, confusão e anarquia, estou reduzido a isso. O que me atrai são questões sobre a natureza da sociedade moderna. Neste diário eu expus as minhas fraquezas. Este misérable humano na sua totalidade está aqui retratado. Escrever o diário foi uma forma de encontrar algum sentido para mim.
O que desejaria, para mim, é andar pelas ruas de Moscou com uma boina na cabeça, estudar economia e política internacional numa Bibliothek alemã ou envolver-me numa análise teórica dos rumos a serem tomados pelo Japão. Se eu viver, é o que farei. Se eu morrer, terá sido um mero sonho. Gostaria de pensar neste diário como o primeiro capítulo do registo de um ser humano que tinha um grande sonho, mas que não encontrou uma solução. Tentei como pude realizar este sonho. Fim.
Hayashi Tadao morre no dia 28 de Julho, aos 24 anos, já depois da rendição aos americanos. O seu avião explodiu numa noite enluarada.
( Síntese a partir da leitura da Revista Piauí, 61, Outubro de 2011)
Um texto democrático. Ninguém pode zurzir pelas esquinas. Todos os poderes foram contemplados.
Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas; um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai; (...)
Uma burguesia, cívica e politicamente corrupta ate à medula, não descriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha, sem carácter,(...)
Um poder legislativo, esfregão de cozinha do executivo; este criado de quarto do moderador;(...)
A justiça ao arbítrio da Política, torcendo-lhe a vara ao ponto de fazer dela saca-rolhas;
Dois partidos (…), sem ideias, sem planos, sem convicções, incapazes (…) vivendo ambos do mesmo utilitarismo céptico e pervertido, análogos nas palavras, idênticos nos actos, iguais um ao outro como duas metades do mesmo zero, e não se amalgando e fundindo, apesar disso, pela razão que alguém deu no parlamento, – de não caberem todos duma vez na mesma sala de jantar (…)
Guerra Junqueiro, A Pátria, 1896
O objectivo do poder é o poder (...) é a autoridade sobre todos os seres humanos. Sobre o corpo, mas acima de tudo, sobre a alma.
G. Orwell
Nota-se, já somos só pele e osso. Daí não actualizarmos a ideia que onde há política, há resistência.
O Homem é herdeiro de experiências: vivemos o presente sempre com o passado às costas.
Os portugueses vivem permanentemente entre dois mundos: o caótico indesejado e um ideal revelado que chegue não se sabe de onde.
Esta oposição encerra o tom em que tecemos a labiríntica História de sinais apocalípticos.
Chegou o tempo de existirmos e de nos vermos tais quais somos, diz Eduardo Lourenço em O Labirinto da Saudade.
Navegar continua a ser preciso.
sophia de mello breyner andresen