Inútil discutir estratégia ou táctica
Inútil saber se entre a serra e a cidade
há ligação ou não.
O que importa é o impulso que vem de dentro
subir a uma montanha dentro de si
olhar em volta e dizer:
" Sejamos realistas
exijamos
o impossível."
Manuel Alegre, Che, Caminho, pág. 20
A arte é uma constante pergunta. É a busca do sentido.
Manuel Alegre, ontem, na TVI 24.
Ítaca. Um percurso de fragmentos íntimos e ínfimos de nós, revelando que a felicidade não existe alhures.
Rumos que mostram que no fim, em cada viagem, há sempre uma porta. A da própria errância; a do saber.
(...)
Como Ulisses ninguém volta ao que perdeu
Como Ulisses não serás reconhecido.
Não vale a pena suportar tanto castigo.
Procuras Ítaca. Mas só há esse procurar.
Onde quer que te encontres estás contigo
dentro de ti em casa na distância
onde quer que procures há outro mar
Ítaca é a tua própria errância.
Manuel Alegre, Obra Poética, Publicações D. Quixote, pág. 832
É possível falar sem um nó na garganta
é possível amar sem que venham proibir
é possível correr sem que seja para fugir.
Se tens vontade de cantar não tenhas medo: canta.
É possível andar sem ser a olhar para o chão
é possível viver sem que seja de rastos.
Os teus olhos nasceram para olhar os astros
se te apetece dizer não, grita comigo: não.
É possível viver de outro modo.
É possível transformares em arma a tua mão.
É possível o amor. É possível o pão.
É possível viver de pé.
Não te deixes murchar.Não deixes que te domem.
É possível viver sem fingir que se vive.
É possível ser homem.
É possível ser livre livre livre.
Manuel Alegre
Amor é mais do que dizer.
Por amor no teu corpo fui além
e vi florir a rosa em todo o ser
fui anjo e bicho e todos e ninguém.
Como Bernard de Ventadour amei
uma princesa ausente em Tripoli
amada minha onde fui escravo e rei
e vi que o longe estava todo em ti.
Beatriz e Laura e todas e só tu
rainha e puta no teu corpo nu
o mar de Itália a Líbia o belvedere.
E quanto mais te perco mais te encontro
morrendo e renascendo e sempre pronto
para em ti me encontrar e me perder.
Manuel Alegre, Obra Poética
Quarteto
Eu não sei se me salvo ou se me perco
ou se és tu que te perdes e me salvas
só sei que me redimo quando peco
e corpo a corpo ao céu vão nossas almas.
Manuel Alegre
Como nós eras altivo
fiel mas como nós
desobediente.
Gostavas de estar connosco a sós
mas não cativo
e sempre presente - ausente
como nós.
Cão que não querias
ser cão
e não lambias
a mão
e não respondias
à voz.
Cão
Como nós.
Manuel Alegre, Cão como Nós
sophia de mello breyner andresen