" Ninguém espera da música ou da arquitectura que reproduzam a realidade sonora nem o mundo das formas que podemos ver na natureza. São linguagens, artes da combinação e da composição de signos e de formas. Pode acontecer que a música reproduza instrumentalmente o som de um fenómeno real, como uma tempestade ou o ruído de uma batalha. Assim, "O amor" ou "vento na planície" são o tema de composições de Claude Debussy. Mas não reproduzem esses fenómenos exactamente: transfiguram-nos, evocam-nos, não os imitam. Uma tempestade numa ópera não é uma tempestade, é música.
Por que razão o que é evidente numa arte como a música deixaria de o ser em pintura? Por que não chamamos ao pintor um "compositor" tal como o fazemos com o músico? Estará o pintor vocacionado para copiar o mais exactamente possível o que é dado ao seu olhar? A sucessão de notas músicais não é uma sucessão de ruídos naturais. Por que razão pensar que o que vemos sobre a tela deve ser o que vemos no mundo?"
Hervé Boillot, 50 modèles de dissertations philosophiques. (adaptado)
sophia de mello breyner andresen