No espaço de poucos minutos, éramos obrigados a bater em retirada e a abandonar a bacia de areia onde rolavam torvelinhos de espuma. O dançarino acompanhou-nos, e viemos a descobrir assim que não era nem louco nem mudo. (...) Estudara simultaneamente dança e escultura em Santiago, depois expatriara-se para os antípodas. O problema do tempo obcecava-o. A dança, arte do instante, efémera por natureza, não deixa vestígios e sofre de não poder enraizar-se em qualquer continuidade. A escultura, arte da eternidade, desafia o tempo e procura materiais indestrutíveis. Mas, com isso, é a morte que acaba por descobrir, porque o mármore possui uma evidente vocação funerária. Nas costas da Mancha e do Atlântico, Lagos (o dançarino) descobrira o fenómeno das marés governado pelas leis astronómicas. Ora a maré ritma os jogos do dançarino de praia, e ao mesmo tempo convida-o à prática de uma escultura efémera.
- As minhas esculturas de areia vivem, afirmava ele, e a prova é que morrem. É o contrário da estatuária dos cemitérios, eterna por não ter vida.
Michel Tournier, Uma Ceia de Amor
(Obrigada, Olga)
sophia de mello breyner andresen